No que se refere à lei, a detenção pode ser privação de
liberdade. O encarceramento que a realiza sempre comportou um projeto técnico.
A passagem dos suplícios, com seus rituais de ostentação, com sua arte
misturada à cerimônia do sofrimento, a penas de prisões enterradas em
arquiteturas maciças e guardadas pelo segredo das repartições, não é passagem a
uma penalidade indiferenciada, abstrata e confusa; é a passagem de uma arte de
punir a outra, não menos científica que ela.
Pena
privativa de liberdade é o cerceamento da liberdade do indivíduo no qual foi
condenado. Ele pode cumprir a pena de prisão no regime fechado e no semi
aberto.
A ordem e a riqueza vêm ver passar de longe a grande tribo
nômade acorrentada, essa outra espécie, a “raça diferente que tem o privilégio
de povoar os campos de trabalhos forçados e as prisões”. Já os espectadores
populares, como no tempo dos suplícios públicos, levam avante com os condenados
as trocas ambíguas de injúrias, de ameaças, de encorajamentos, de golpes, de
sinais de ódio ou de cumplicidade. Qualquer coisa de violento se ergue e não
pára de correr ao longo de toda a procissão: cólera contra uma justiça severa
ou indulgente em excesso; gritos contra criminosos detestados; movimentos a
favor dos prisioneiros conhecidos e que são saudados.
Há entretanto nesses cantos coletivos uma outra tonalidade;
inverte-se o código moral a que obedecia a maior parte das velhas queixas. O
suplício, em vez de trazer o remorso, aguça a vaidade; a justiça que condenou é
recusada, e recebe vitupérios a multidão que vem contemplar o que ela pensa ser
arrependimentos ou humilhações: Tão longe dos lares, às vezes, gememos. Nossas
frontes sempre severas farão empalidecer nossos juizes... Ávidos de desgraça,
vossos olhares em nosso meio procuram encontrar uma raça vencida que chora e se
humilha. Mas nossos olhares são orgulhosos.
A nós, forçados, o desprezo pelos homens. A nós também todo o
ouro que eles deificam. Esse ouro, um dia, passará a nossas mãos. Nós o
compramos pelo preço de nossa vida. Outros retomarão essas cadeias que hoje vós
nos fazeis levar; eles se tornarão escravos. Nós, rompendo os encraves, o astro
de liberdade terá reluzido para nós... Adeus, pois desprezamos tanto vossos
ferros quanto vossas leis
Ora, o que foi adotado, em junho de 1837, para substituir a
cadeia, não foi a simples carroça coberta de que se falara um momento, mas uma
máquina bem cuidadosamente elaborada. O sistema de punições, conforme o
regulamento interno da carruagem: regime de pão e água, dedos polegares amarrados,
privação da almofada para dormir, os dois braços amarrados. “É proibida
qualquer leitura senão a dos livros de moral”.
Avalia-se na França em cerca de 108 mil o número de
indivíduos que estão em condição de hostilidade flagrante à sociedade. Os meios
de repressão de que dispomos são: a forca, o pelourinho, 3 campos de trabalhos
forçados, 19 casas centrais, 86 casas de justiça, 362 cadeias, 2.800 prisões de
cantão, 2.238 quartos de segurança nos postos de policia. Apesar desta série de
meios, o vício conserva sua audácia. O número de crimes não diminui;... o
número de reincidências aumenta mais que decresce.
A prisão torna possível, ou melhor, favorece a organização de
um meio de delinqüentes, solidários entre si, hierarquizados, prontos para
todas as cumplicidades futuras. Enfim a prisão fabrica indiretamente
delinqüentes, ao fazer cair na miséria a família do detento: A mesma ordem que
manda para a prisão o chefe de família reduz cada dia a mãe à penúria, os
filhos ao abandono, a família inteira à vagabundagem e à mendicância. Sob esse
ponto de vista o crime ameaça prolongar-se.
A educação do detento é, por parte do poder público, ao mesmo
tempo uma precaução indispensável no interesse da sociedade e uma obrigação
para com o detento. Só a educação pode servir de instrumento penitenciário. A
questão do encarceramento penitenciário é uma questão de educação. O tratamento infligido ao prisioneiro, fora
de qualquer promiscuidade corruptora... deve tender principalmente à sua
instrução geral e profissional e à sua melhora (Princípio da educação
penitenciária).
Segundo o
Jornal da Globo, o numero de presos dobra em 10 anos e passa dos 600 mil no
país, levantamento do G1 faz raio X do
sistema prisional no Brasil em 2015, faltam 244 mil vagas nas cadeias; 39% dos
presos são provisórios:
Com um déficit de 244 mil vagas no sistema penitenciário, o Brasil já
conta com 615.933 presos. Destes, 39% estão em situação provisória, aguardando
julgamento. É o que mostra um levantamento feito pelo G1 com
base em dados fornecidos pelos governos dos 26 estados e do Distrito Federal
referentes a maio deste ano. (GLOBO, 2015)
Governo holandês estuda fechar prisões devido à
falta de criminosos, secretário de Estado anunciou fechamento de 19 cadeias no país, baixa
criminalidade e uso de tornozeleiras deixou celas vazias:
A falta de criminosos
na Holanda foi muito discutida pela mídia internacional pela
primeira vez em 2009, quando o governo inicialmente anunciou o fechamento de 8
unidades prisionais, e, diante das demissões que seriam feitas, estava
estudando a possibilidade de importar 500 criminosos da Bélgica, para que possa
manter um contingente nas prisões. (GLOBO, 2015)
Referências:
CITTADINO, Gisele. Orden Jurídico y orden psiquiátrico.
[19--]. Texto mimeografado.
CHAVES, Ernani. Foucault e a psicanálise, Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 1988.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Organização e
tradução de Roberto Machado. Rio de Janeiro: Graal, 1982.
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